Pastor, não sacrifique seu ministério por causa de sua família – Rev. Valdeci Santos
O trabalho pastoral é o cumprimento de uma santa vocação à abnegação e dedicação a Cristo, pelo cuidado com a igreja que ele “comprou com o seu próprio sangue” (At 20.28). Nesse serviço, não existe espaço para a indolência ou desleixo. Porém, muitos pastores acabam negligenciando a igreja por estarem demasiadamente ocupados com as causas domésticas.
É comum receber instruções para que pastores não sacrifiquem suas famílias no “altar” do serviço ministerial, mas o que dizer daqueles que negligenciam as funções ministeriais e descuidam da igreja por causa da família? Alguns pastores não visitam, não aconselham, não preparam adequadamente suas mensagens e nem cultivam qualquer atividade evangelística na agenda semanal por estarem totalmente dedicados à causa familiar. Nesse sentido, é possível que aos olhos da igreja o ministro se torne “invisível” durante a semana e “incompreensível” aos domingos!
Sem dúvida a família deve gozar de prioridade na agenda de qualquer marido cristão, principalmente o pastor da igreja. Por ocupar uma posição de liderança, o relacionamento doméstico do pastor é fundamental para o desempenho de suas atividades, pois “se alguém não sabe governar a própria casa, como cuidará da igreja de Deus?” (1Tm 3.5). Além do mais, seu exemplo nessa área influencia a outros na igreja, principalmente os jovens casais. Logo, se o ministro negligencia os de sua própria casa, além de negar e contradizer os princípios da fé cristã (1Tm 5.8), acaba estabelecendo um péssimo modelo a ser seguido por suas ovelhas. Dessa maneira, nenhum pastor deveria priorizar o seu ministério em detrimento de sua família, mas isso não significa que ele possa sacrificar seu ministério por cuidar somente de sua família.
Há dois extremos a serem evitados no relacionamento do ministro com sua família e com sua igreja local. O primeiro, e mais comum, é o pastor negligenciar sua família por causa das inúmeras atividades da igreja. De fato, alguns acabam cuidando mais da noiva do Cordeiro do que de sua própria esposa (uma forma de adultério!) e filhos. Mas o oposto disso é o erro de idolatrar a família a ponto de fazer a obra do Senhor relaxadamente, no que diz respeito ao cuidado com a igreja! A falta de equilíbrio nesse sentido tem sido danosa a muitas vidas.
A agenda de atividades do pastor lhe permite flexibilidade em vários momentos do seu dia. Pastores são abençoados por poderem almoçar com a família, pois nem todos os membros de sua congregação gozam desse privilégio. Também, é possível que alguns pastores consigam se ausentar com facilidade de seus gabinetes para atenderem a alguma emergência na escola dos filhos ou prestar algum auxílio nas tarefas domésticas para aliviar a carga da esposa. Claro que nesses casos, o pastor sempre compensa essas horas com inúmeras noites que ele dedica aos seus estudos e preparação de sermões, reuniões administrativas ou visitas hospitalares. Ademais, sua agenda inclui ainda atendimentos a famílias em crise e esses, geralmente são feitos em horários incomuns, que afetam seu convívio familiar. Tudo isso só é possível porque a agenda do pastor é flexível. A bênção de possuir uma agenda diferenciada precisa ser sempre observada.
Realmente o cuidado com a esposa e com os filhos deve ser prioritário para o pastor, mas isso não significa que eles devem ser os únicos a receber sua atenção. Algumas vezes, as necessidades do ministério pastoral implicam que outros recebam o cuidado do pastor até mais do que sua própria família. Conquanto esses compromissos sejam ocasionais, é importante que eles sejam usados também de maneira pedagógica, pois nessas situações a família do pastor pode aprender a exercitar o amor sacrificial ou mesmo a solidariedade e compaixão pelos outros, colocando as necessidades de outras pessoas à frente das suas. Ao agirem assim, cumprirão o princípio bíblico de darem a preferência da honra aos outros (Rm 12.10).
Assim como a família pode ser sacrificada no “altar” do ministério pastoral, esse também pode ser sacrificado no “altar” da família. Para evitar que tal tragédia ocorra, é possível que o ministro tome algumas precauções a esse respeito. Abaixo deixo apenas algumas sugestões:
1 – Evite murmurar quanto ao tempo que você dedica ao ministério. É verdade que a atividade do pastor requer mais do que a carga horária comumente requerida de um trabalhador. Isso não faz com que sua agenda seja pior; é apenas diferente. Muitos empresários, médicos, representantes comerciais e outros profissionais também possuem atividades que demandam mais tempo deles do que é exigido de outros trabalhadores. Além do mais, alguns desses profissionais são líderes comprometidos com a igreja local a ponto de dedicarem outras tantas horas aos interesses do rebanho. Portanto, a murmuração nesse sentido acaba não sendo justa. Também, murmuração resulta em “raiz de amargura” e essa tem o poder de contaminar aqueles que estão mais próximos de nós, ou seja, a esposa e os filhos (Hb 12.15). A murmuração nos fará gemer ao realizar a obra do Senhor e isso contraria o princípio bíblico (Hb 13.17).
2 – Procure envolver sua família nas atividades ministeriais. Por exemplo, leve sua família para visitar os membros de sua congregação contigo. Peça a seus filhos para acompanhá-lo em visitas hospitalares e a sua esposa nos atendimentos aos casais em crise. Nas devocionais domésticas, convide os filhos para orarem pelos membros da igreja, pelos visitantes, bem como pelas programações vindouras. Tudo isso é uma forma de discipulado e pode ajudar sua família a se sentir parte do seu ministério. Ademais, sua família pode aprender a se interessar por outras pessoas e se dispor a ser instrumento para abençoar o restante do corpo. O resultado poderá ser uma bênção para você, sua igreja e, principalmente, sua própria família.
3 – Converse com sua esposa sobre a real necessidade de sua participação em tantas atividades domésticas. Talvez seja possível organizar melhor as atividades para que você não se ausente tanto do trabalho da igreja. Por exemplo, levar os filhos à escola é uma necessidade, mas seria preciso permanecer naquele ambiente o turno todo que seus filhos estão estudando? Haveria alguma possibilidade de retornar para o contexto da igreja, visitar algum membro ou fazer alguma outra atividade eclesiástica? Alguns pastores gentilmente cuidam da limpeza da casa para a esposa e isso é muito nobre! Mas seria possível pagar a uma faxineira para fazer isso, se sua esposa não pode fazer? Enfim, não se trata de prejudicar a família, mas o ministério também inclui atividade fora do círculo doméstico, ou seja, fora de casa.
4 – Estabeleça uma agenda para suas atividades domésticas. No geral, tensões são frutos daquilo que não foi acordado ou programado. O ministério pastoral já possui muitas demandas urgentes e o pastor frequentemente tem a sensação de estar “apagando incêndio” o tempo todo. Quando a mesma coisa acontece no ambiente doméstico, a pressão se torna insuportável, o peso esmagador da responsabilidade e o potencial para conflitos aumentam. Logo, o melhor a fazer é estabelecer limites e organizar melhor a rotina. Se o pastor acordar com sua família sobre uma agenda para as atividades domésticas, não precisará ficar o tempo todo à disposição, mas saberá quando poderá se dedicar sem reservas ao cuidado do seu rebanho. Esse acordo de mútuo respeito pode ser benéfico a todos.
5 – Use sua residência em benefício do ministério pastoral. Alguns compromissos ministeriais se tornam mais agradáveis ao redor de uma mesa com café e acompanhamentos e o ambiente doméstico é favorável a esses momentos. Podemos recepcionar os novos membros da igreja em nossa casa, ou agradecer ao visitante frequente à igreja com um convite para uma visita também à nossa residência. Sessões de aconselhamentos pré-nupciais também podem ocorrer em nosso ambiente doméstico, pois os noivos terão a oportunidade de observar uma família comprometida com o trabalho da igreja. Na verdade, até algumas reuniões com a liderança da igreja podem ocorrer em nosso ambiente doméstico, pois os presbíteros precisam saber como vive o pastor deles. Quando essas coisas ocorrem, conseguimos realizar atividades importantes do ministério e ainda estar ao redor daqueles que amamos tanto, ou seja, nossa família.
Tanto a vida doméstica quanto o ministério pastoral exigem alguns sacrifícios do pastor. O pior sacrifício a ser feito, porém, é aquele que é desnecessário. Ou seja, aquele que foi feito em expressão de adoração a um ídolo ou à indolência de quem não levou a sério o que foi sacrificado. Nesse sentido, pastor, não sacrifique seu ministério por causa de sua família, pois isso não resultaria em glória a Deus nem no benefício dos de sua casa.
Rev. Valdeci Santos (Diretor do CPAJ – IPB)